"O artista é o viajante feliz que, após ter longamente navegado sobre as águas da dúvida, nas trevas do esforço, pode, enfim, bradar: terra!"

(Mikel Dufrenne)

terça-feira, 29 de setembro de 2009

PESCARIA


Um homem
que se preocupava demais
com coisas sem importância
acabando ficando com a cabeça cheia de minhocas.
Um amigo lhe deu então a idéia
de usar as minhocas
numa pescaria
para se distrair das preocupações.
O homem se distraiu tanto
pescando
que sua cabeça ficou leve
como um balão
e foi subindo pelo ar
até sumir nas nuvens.
Onde será que foi parar?
Não sei
nem quero me preocupar com isso.
Vou mais é pescar.

(José Paulo Paes)
Pergunte ao meu eu lírico



Quando o meu eu lírico me chama,
Logo penso:
Sairá algo bom?

E mais... quem será ele?

Um bucólico, um sentimentalista,
Um existencialista, um idiotista...?


Se algum dia um crítico
Descobrir, me avise.
Quero sabê-lo.
Quem sabe assim,
Posso me entender.

(Michael Bonadio)
AMOR ETERNO

A felicidade se fez ausente.
Resta a tristeza a este demente.
As flores no jardim estão a murchar.
Minha amada, delas não estás a cuidar.

Acendo um cigarro para aliviar a solidão.
Pouco adianta, é grande a dor no coração.
Anjos, não era este o momento de a levar.
Minha amada, contigo quero estar.

Todas as noites em meus sonhos tu estás.
E nele o seu lindo rosto posso tocar...
Minha amada, continue a me esperar.

E os dias passam lentamente.
Os pássaros tristes nas árvores estão a cantar.
Minha amada, por toda vida vou te amar.

(Edilson dos Resis)


SOLIDÃO

Na vida não fui poeta
simplesmente um sonhador,
que vivenciou toda dor
causada pela perda
de um grande amor.

Se hoje os meus olhos
inundados por lágrimas estão,
é que magoado se fez
o pobre coração,
entre tanta ilusão.

Sem que me cuidasse,
deixei que os meus sonhos
de amor um anjo levasse;
e quando fui perceber
estava sem motivos para viver.

Aquelas lindas maçãs
vermelhas como as rosas
que um dia beijei,
hoje sei que jamais as verei
e em seus seios não mais repousarei.

Hose a solidão se fez!
Uma vida errante...
Não me tornei amante;
e sempre fiquei a acreditar
que um dia fosses me amar.

(Edilson dos Reis)
LEMBRANÇA


“Perante estas eras sombrias,
Açoitadas por ventanias;
Terrível, sombrio, maldito,
É aquele que agora invoco!

“Meu coração palpitante,
Num sofrimento gritante,
Urra um nome sombrio,
De tom maldito, horrível,
Que em vão tento esquecer...

“Tua face me recorda
De tempos há muito perdidos,
Que, no Limbo esquecidos,
Aplacam meu sofrimento...

“Um som agourento
Recorda-me do terror
E uma vez mais sinto a dor
Neste corpo funesto,
Nesta face que detesto!

“Ah, se o ódio aplacasse,
E essa dor findasse,
Num simples enlace,
Arrancaria minh’alma!

“Mas ainda assim sofro,
E pelo Inferno corro,
Desesperado...

“E aqui me encontro,
Tão desolado, abandonado!
E ainda sinto a dor, o terror!

“PÁRA DE ME FAZER SOFRER!
EU SÓ DESEJO MORRER!

“Mias falanges rangem
Teu retrato apagado
Pelo Tempo açoitado
De modo tão irado...

“Tua face me recorda
Daquilo que em mim mora
Sem nunca morrer...

“Mas meu corpo recusa,
E minha alma acusa
De que era em vão...

“Passo a detestar
E a tudo odiar,
Para que uma vez mais
Possa descansar...

“Mas minha mente recusa,
E novamente de mim abusa,
Pois me volta a lembrar...

“Como era doce teu toque,
Que em minha pele agora morre,
Em puro desespero...

“Sonho uma vez mais contigo,
Aqui, neste frio jazigo,
Em meio à podridão...

“Rasgo-me novamente
E ao longe eu lanço
Num maldito balanço
Meu coração dormente!

“Eu quero apenas parar de sofrer!
E seu amor eu hei de esquecer!
Maldita traidora!
Maldita! Maldita!
Que apodreças em sua pose
De doce senhorita!
Pois ainda é apenas carne!

“Te odeio! Te detesto!
E por isso ao Abismo peço
PARA QUE MORRAS SOFRENDO NO INFERNO”
(Conde Darkheart)

sábado, 19 de setembro de 2009

Realidade Perdida



Tom estava no quarto olhando para o teto; via nele as estrelas escondidas. No teto branco imaginava o cosmo sobre suas vidas. Suas vidas...
Mas vida de quem?
Lembrou-se então da semana passada quando feliz estava por ter conseguido o emprego que sempre sonhara.
Você começa amanhã! – disse com ênfase o gerente do setor de produção de “grande empresa grande” da cidade.
Amanhã começa minha vida nova, pensava consigo, tudo que sempre quis agora realizarei.
Seus sonhos não eram muitos: queria um lugar para viver, roupas para vestir, um transporte próprio para ir e vir.
A vida agora seria outra.
Acordou ainda antes do sol nascer, não queria se atrasar; pegou duas conduções, as duas cheias.
O dia passou rápido; a empolgação não deixara olhar para o relógio.
Chegou tarde em casa, pois tinha perdido a conexão no terminal de ônibus. Mas ainda assim com um sorriso de orelha a orelha.
Sua mãe percebeu seu cansaço e ofereceu-lhe o jantar; não respondeu, pois estava dormindo. E num sorriso orgulhoso ela disse: meu filho é alguém.
A semana passou; os dias iam iguais. Com o fim de semana se aproximando, o sorriso que aos poucos tinha sumido, voltou. O descanso merecido: todo trabalhador tem direito de descansar, dizia consigo.
“Devido ao grande sucesso de nossa empresa teremos que trabalhar neste fim de semana. Lembrem-se: trabalhamos juntos crescemos juntos.”
Este era o cartaz colado ao lado do cartão de ponto.
Ele tinha medo de sentir-se com raiva pela situação, pois iria ganhar mais. Porém feliz não estava.
“... teremos que trabalhar (...) juntos...”.
Isso fez o paradoxo em seus sentimentos diminuir quando soube na segunda-feira que seus patrões passaram o fim de semana na Europa.
No quarto imaginava seu futuro, baseado em seus colegas de empresa mais antigos: os dias, as semanas, os meses, os anos passando. A vida; a mesma. De seus sonhos apenas uma moto, que o faria preso a esta situação por quarenta e oito prestações.
Olhando para o alto lembrava de uma aula sobre o cosmo; o espaço é um vácuo cheio de corpos celestes donde tem-se a provável origem de tudo. E o que é o vácuo? – pensou concentrando-se na parede branca sem nada e dormiu.


(Michael Bonadio)
Ajuda-me


Ajuda-me a não me ser.
Ajuda-me a não te ser.
Ajuda-me a não lhe ser.
Ajuda-me, Ajuda-me, Ajuda-me.
Ajuda-me a parar de ver.
Ajuda-me a querer ter.
Ajuda-me a poder fazer.
Ajuda-me, Ajuda-me, Ajuda-me.
Ajuda-me a não me desesperar
Quando na noite não puder falar,
Ajuda-me, Ajuda-me, Ajuda-me.
Ajuda-me a saber entender
O porquê de querer me socorrer.
Ajuda-me, Ajuda-me, Ajuda-me.

(Michael Bonadio)
A Fábula dos Monstros seus


Era uma vez uma vila – que de tão longe só nossa imaginação pode ver – nos quais seus moradores, apesar de honrados, trabalhadores, não enfrentavam seus monstros. Tinham medo e assim se fechavam.

O único lá que saía, era um jovem Cavaleiro de visões quixotescas; ele rompia portões e travava lutas sem iguais. Depois das batalhas os olhos dos outros moradores se enchiam de orgulho alheio; ele todo feliz voltava com a sensação de dever cumprido.

Um dia, porém, não saiu em nenhuma empreitada; foi olhando à sua volta e vira que tudo era igual, nada mudava depois das batalhas. As pessoas sorriam e continuavam suas vidas; ele por sua vez, perdera aos poucos aquela boa sensação. Desse dia em diante não saiu mais de casa.

As pessoas ficaram assustadas. Como enfrentar seus monstros? Tentaram de tudo para convencê-lo: deram-lhe armas novas, um cavalo mais rápido, uma armadura de ouro; nada fazia o nosso herói sair.

Quando menos se esperava o maior de todos os monstros apareceu; todos ficaram desesperados e se esconderam. O monstro, porém, queria apenas o jovem rapaz. Ele invadiu seu leito e o chamou à briga; deu-lhe alguns golpes, mas o jovem não reagia. Quando viu que nosso herói não se mexia começou destruir tudo que via à sua volta, para chamar a atenção dele e nada.

Os moradores da vila correram em apoio ao errante e espantaram o monstro.

Felizes, não viram quando como num passe de mágica sumira o nosso bravo, errante, heróico, destemido, Cavaleiro.

Moral da história: para enfrentar seus monstros às vezes não precisamos de nada.

(Michael Bonadio)

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

A antítese do ser



Não me reconheço.
Não sou o mesmo.
Antes era um,
Agora outro.
Quem sou?
Não sei.
Tudo mudou.
Um calmo, esperançoso,
Simples,
Mas, ignorante, egoísta,
Buscava o topo dos sonhos.
Não sei o que aconteceu.
Será que foram as Letras,
O excesso de tudo?
O mundo novo?
Talvez foi a sensação?
Não entendo.
Perguntas? Respostas?
Procuro e não acho.
Mas, agora o outro atual
Elegante, pensante
Amante e diferente.
Busca um porquê.
No sei do quê.
Para quê?
Sente o vazio
E o completo.
O que acontece?
Especialistas também não entendem.
A dupla personalidade:
Uma humana animal
A outra humana racional.
Assim, como o meu vazio completo
São meus versos
Podem dizer o tudo ou o nada.
Assim é minha poesia
Complexa,
Simples.
Quem entende?
Sei lá.

(Alex Moretto)