"O artista é o viajante feliz que, após ter longamente navegado sobre as águas da dúvida, nas trevas do esforço, pode, enfim, bradar: terra!"

(Mikel Dufrenne)

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009




Descansem o meu leito solitário

Na floresta dos homens esquecida,

À sombra de uma cruz, e escrevam nela:

- Foi poeta - sonhou - e amou na vida. -



Álvares de Azevedo

(1832-1851)


Bruna Danielle Guimarães Zafani, 21 anos, é graduada em Letras pela Faculdade Bandeirantes, Ribeirão Preto (2007). Em 2008, cursou como aluna ouvinte a disciplina "Poesia e Vanguarda", ministrada pelo prof. Dr. Adalberto Luís vicente, e como aluna especial a disciplina "A teoria literária na prática: a leitura de poesia em um universo interpretativo em mudança", ministrada pela prof. Dra. Maria Clara Bonetti Paro, ambas as disciplinas oferecidas pelo programa de pós-graduação em Estudos Literários da UNESP/Araraquara. Abaixo, transcrevemos um trecho da sua monografia Um estudo da poética pessimista de Baudelaire e Emily Dickinson, apresentada para a segunda disciplina citada, onde faz uma leitura interpretiva de um poema de Baudelaire.


O gosto do nada

Espírito sombrio, outrora afeito à luta,
A esperança, que um dia te instigou o ardor,
Não te cavalga mais! Deita-te sem pudor,
Cavalo que tropeça e cujo pé reluta.

Conforma-te, minha alma, ao sono que te enluta.

Espírito alquebrado! ao velho salteador
Já não seduz o amor, nem tampouco a disputa;
Não mais o som da flauta ou do clarim se escuta!
Prazer, da trégua a um coração desfeito em dor!

Perdeu a doce primavera o seu odor!

O tempo dia a dia os ossos me desfruta,
Como a neve que um corpo enrija de torpor;
Contemplo do alto a terra esférica e sem cor,
E nem procuro mais o abrigo de uma gruta.

Vais levar-me, avalanche, em tua queda abrupta?

(Charles Baudelaire: 1821-1867)



O presente poema de Baudelaire apresenta-se em seis estrofes de formas irregulares, nas quais predominam os versos alexandrinos.
Porém, o poema segue um ritmo embalado pela predominância das rimas pobres, seguidas de intercalações emparelhadas e interpoladas.
A princípio, o eu lírico faz a apresentação de um “ser” monstruoso desconhecido. Para tanto, há uma constatação metafórica que sonda a figura misteriosa: a perca da esperança comparada a um cavalo, uma impressão que veio devagar, a “galope”. No entanto, é viável ressaltar que este animal fundido a esta esperança é doente, medroso, que hesita, mostrando uma fraqueza esperançosa. Além do sentimento, outro fator humaniza o cavalo, ele ao invés de cavalgar com as patas, foge ao comum e assume um “pé”, o que aproxima o animal à figura humana:


Não te cavalga mais! Deita-te sem pudor,
Cavalo que tropeça e cujo pé reluta.

A Esperança, personificada, remete à imagem de uma musa que instigava a chama criadora do poeta e que não o move mais. Ela deixa de cavalgar a alma do poeta e o cavalo – signo que remete à virilidade e à impulsividade, agora lida com a perda, não apenas da esperança, mas também de sua essência.
O “amor que não seduz o velho salteador” evidencia o desinteresse do eu, numa imagem que nos remete a um D. Juan que perdeu a sua razão de ser.
A perda da razão de ser acentua-se a partir do verso:

Não mais o som da flauta ou do clarim se escuta!

A música, que para os simbolistas tinha uma comunhão artística com a poesia, cala-se, silenciando o sentido da vida.
Entretanto, o eu lírico desfruta de um coração partido, desta falta de esperança, da morte da alma, do pessimismo constante e da anulação da vida. Ele tenta se conformar com a sina que o cerca, mas com o passar do tempo, torna-se difícil permanecer em uma existência sem perspectiva, tanto que a sua matéria para perante a tanta dor e mal estar:


Espírito alquebrado! ao velho salteador
Já não seduz o amor, nem tampouco a disputa;
Não mais o som da flauta ou do clarim se escuta!
Prazer, da trégua a um coração desfeito em dor!

É o desassossego, a angústia pertinente, que ao mesmo tempo leva-o à exaltação, transporta sua existência ao puro vazio. O gosto pelo nada, característica enfatizada no momento Romântico, veio a Baudelaire como um anseio ao novo. A saída é propor um fim para iniciar a vida. Apresentar o Spleen, o tédio fatal da vida para construir novidades, para retomar e adquirir esperança de viver, encenar a vida cotidiana e moderna como exemplo de (não) existir. Tanto que o eu lírico se transporta ao posto de telespectador de si mesmo, que não se esconde no plano que não o agrada, conforme consta no seguinte verso:

Contemplo do alto a terra esférica e sem cor,
E nem procuro mais o abrigo de uma gruta.

Essa separação do universo em mundo contemplado e eu - observador é herança daquela ironia romântica, que prenunciava, pela divisão e pela cisão do ser, o niilismo moderno. Rompe-se o sentido de unidade entre o eu e a natureza, para impor-se uma visão de mundo fragmentada pela consciência. A própria separação que o eu lírico descreve entre o passado prazeroso e o presente amargo nos leva a entender que o poeta cria uma ruptura temporal que assinala a morte e a “nidificação” do ser.
Mas este é um processo lento, tanto que há alguns versos isolados, relatando a partir de suas formas, a passividade de expectativas:

Perdeu a doce primavera o seu odor!

O tempo dia a dia os ossos me desfruta,
Como a neve que um corpo enrija de torpor;

Em determinado instante, dá-se a impressão que o eu lírico é seduzido por uma realidade negativa, que caminha em função do nada, o que não é o caso. Ele está enojado por uma existência rotineira e medíocre, que através de uma exatidão melancólica, busca um espaço liberto:

Vais levar-me, avalanche, em tua queda abrupta?

Além disso, o eu lírico questiona a morte, carregando ansiosamente, com ironia, o desejo de ser consumido por ela.









Carlos Eduardo de Brito Aragão, residente em Bonfim Paulista, é estudante de Letras na Faculdade Bandeirantes - Ribeirão Preto - e, amante de Literatura, vem compondo versos, participando de concursos literários e se destacando como poeta. Abaixo, transcrevemos alguns de seus poemas.

O que é o amor?*

O amor é sonho?
O amor é dor?
É apenas sentimento?
É grande? É pequeno?
Branco? Negro?
Acaso é liso?
Ou áspero?

Não sei por certo,
Só sei que quando vem
Realiza mudanças
Faz de um adulto uma criança.

Não escolhe idade, classe ou cor.
Quando vem quer quebrar as barreiras
Não enxerga as aparências,
Mas penetra o profundo, o íntimo, o âmago.

É como um anestésico,
Deixa a pessoa boba,
Suspirando, sorridente
Babando cor- de- rosa.

Amolece os corações de pedra,
Tornando-os tão macios
Como a fina seda.

No entanto,
Para que saber o que é o amor?
Se eu posso senti-lo e vivê-lo!
Experimentar do seu mel
Sentir o pedaço do céu.

Enquanto alguns se preocupam com definições
Vou vivendo e aprendendo,
Porque o amor é subjetivo
E cabe a cada pessoa interpretá-lo
Do modo como quiser.

(Carlos Eduardo de Brito Aragão)

*Poema premiado com o 3º lugar no XII Concurso de Poesia Moderna do Sindicato dos Comerciários



Chora Amazônia*

Chora Amazônia!
Derrama o teu pranto sentido
Lamenta tuas árvores caídas.
Teu verde, tua sombra, tua natureza.

Oh, Amazônia!
Solta a tua lágrima de dor
Grita pelos teus animais,
Que morrem a cada dia:
Aprisionados, feridos, torturados, contrabandeados.

Sim, Amazônia
É grande a tua dor!
O homem, que deveria ser “humano”,
Torna-se o mais cruel dos animais.
Ferindo o teu chão
Roubando a tua paz.

Reza Amazônia!
Ora ao Criador
Pela consciência do homem,
Para que volte a si
E pense em seus filhos
Que poderão ter um futuro incerto.

Fala ap pé do ouvido de cada criança
Para que não repitam os erros dos pais,
Aumentando a chama da esperança.

Enquanto o progresso avança,
Tua vida, Amazônia, vai se acabando.
E o homem, cego pela ambição,
Destrói a si próprio.

Ainda há tempo, Amazônia,
De mudar esse quadro.
Mas tem que ser agora,
Porque quando a última árvore cair
E a última gota de sangue
Manchar o teu solo,
Aí será tarde demais.

(Carlos Eduardo de Brito Aragão)

*Poema premiado com o 2º lugar no XI Concurso de Poesia Moderna do Sindicato dos Comerciários



Quem sou eu?

Sou menino brincando com o tempo
Como a folha que brinca com o vento
E voa nos campos da vida.

Nessa terra de sonhos perdidos
De piratas, fadas e lendas,
Ergo meu castelo encantado
Pra salvar a Rapunzel.

Sou herói que voa no céu
Pra defender a cidade do mal.
Super-Homem
Com visão de raio-X
Sou peralta, sou feliz.

Gosto de correr
Brincar de esconde-esconde,
Dançar canções alegres
Comer doces e balas.

Vou à escola
Aprender o bê-á-bá.
Preciso estudar e brincar
Sou pequeno demais para trabalhar.

Sou a semente
Que germinará no futuro.
Quem não for como eu
Não entrará no Reino de Deus.

Já sabe quem sou eu?
Sou criança, sou a esperança,
Sou o futuro feliz.
Sou anjo na terra
Sou o futuro do país.

(Carlos Eduardo de Brito Aragão)




Mensagem ao professor

Mestre, educador.
Pai das letras, professor.
São nomes diferentes
Desse grande construtor.

Suas palavras são ferramentas
Que transformam cada aluno
Em sementes de saber.
Para que no futuro
Frutifiquem doutores.

Como é belo observar
Toda dedicação!
Todo amor depositado
No movimento do giz.
Palavras que surgem na lousa,
Olhos que brilham
Vendo o aluno que aprendeu.

Querido professor,
Se hoje posso escrever
Devo a Deus e a ti.
Lembro-me do a-e-i-o-u,
Das letras que se juntaram
Formando palavras.

Das palavras surgiram versos
Dos versos surgiram poemas.
E agora, do meu coração,
Surge uma palavra simples
Cheia de gratidão:
“OBRIGADO!”

(Carlos Eduardo de Brito Aragão)